Eu sempre fui de me apaixonar fácil. Desenvolvi essa capacidade
com o Leonardo DiCaprio, depois com o meu professor de biologia, o professor de
literatura, o carinha da biblioteca... mas, todos - todos - platônicos. E
sempre me dei muito bem com isso. Até porque naquela época a reciprocidade do
beijo de língua não me parecia muito higiênica.
Até que um dia
encontrei um garoto alto, de pele morena, cabelo liso partido para o lado, um
sorriso bonito e um olhar de estrelinhas. Gostei dele de cara. Estudávamos
juntos no cursinho e logo descobrimos afinidades maiores do que passar para a
mesma escola técnica. Nós gostávamos das mesmas séries, os mesmos filmes, os
mesmos desenhos animados, revistas em quadrinhos. Conversávamos na entrada da
aula, no intervalo e não demorou muito para matarmos aulas.
Eu sentia algo
diferente por ele... e não demorou muito para que ele começasse a sentir o
mesmo por mim.
Eu, afobada como
sempre, declarei logo que era amor e ele, entrou na dança. Nos gostávamos, nos
dávamos bem e isso bastava. Andávamos de mãos dadas, ríamos, ficávamos pertinho
um do outro, mas nada de beijos ou contato mais físico. O ano acabou. Nós não
passamos. Ficamos em escolas diferentes e foi ai que o negócio começou a mudar.
Eu já andava
toda tristinha e desacreditada no cupido quando ele apareceu na minha escola.
Quase morri. Coração acelerado, pernas bambas, borboletas no estômago. Meu
Deus, eu estava apaixonada. Foi nesse mesmo dia o nosso primeiro beijo. O meu
primeiro beijo.
Gamei mesmo.
Dessa vez era diferente das outras paixões. Dessa vez era verdadeiro e
recíproco. Pelo menos era isso que eu achava. Ele foi meu primeiro amor e,
consecutivamente, minha primeira e mais dolorosa (por ser a primeira) decepção.
Chorei. Chorei
tanto que seria capaz de acabar com a seca no sertão! Me dediquei a uma fossa
com direito a ouvir as mais tristes músicas de Sandy e Júnior e me acabar em
algumas caixas de chocolate.
Me fechei para
balanço. Durante esse período eu ficava com a saudade e ele com outro alguém.
Era estranho
porque eu não tinha mais notícias dele, não o via com nenhuma frequência e não
nos restou mais nenhum amigo incomum, mas de alguma forma ele permanecia
comigo. Se eu tivesse ido a um psicanalista naquela época ele diria que se
tratava de um trauma "pós-pé-na-bunda", talvez eu não conseguia
aceitar a rejeição já que eu sempre fui bastante mimada e amada por todos à
minha volta. Enfim, racionalmente existiam inúmeras teorias, mas não era isso.
Eu sabia que era algo mais forte.
O tempo enfim
passou. Eu conheci outros garotos, namorei alguns deles, larguei esse troço de
amor e me concentrei nos estudos. Entrei na faculdade.
Dia 08 de junho
de 2011. Entro atrasada pra aula e me deparo com a última pessoa que imaginava
ver na vida: Ele. Todo sonso teve a cara de pau de vir falar comigo como se eu
fosse uma amiga de infância. E foi assim que eu passei a me comportar: A partir
daquele dia, éramos, de fato, amigos de infância.
Ele havia
mudado. Já não tinha as tais estrelinhas que me encantaram. Agia como todos os
outros. Tinha se transformado em um devorador de corações. Teve seu coração
devorado. Eu fui amiga, conselheira, terapeuta e quase fada madrinha. O tempo
passou e eu passei a enxergá-lo como nunca enxerguei ninguém na vida. Eu o
conhecia, por fora e por dentro.
Alguns chamam de
bipolaridade, outros juram ser traços de características sociopatas, mas eu
não. Não o julgo porque o conheço. Porque eu sei exatamente o que ele sente.
Sei como é ser um E.T. Não, não tem nada a ver com outro planeta . Não precisa
informar ninguém da NASA! Não é disso que eu falo. Falo do "não se
encaixar". Do sorrir por fora e gritar por dentro. De achar tudo um saco e
fazer cara de paisagem. É sentir algo que dói. Uma dor que passa quando se está
acompanhado, mas sempre volta a doer quando se fica sozinho. Dói mais ainda no
meio da multidão.
Nossa relação é
estranha. Eu estou sempre falando as mesmas palavras a ele. Ele, por sua vez,
permanece com sua teimosia. E a gente segue se desentendendo, se
desencontrando, seja no silêncio ou na repetição dos clichês. Nunca se
afastando realmente e também nunca juntos. Uma lengalenga que pode até parecer
amor - e eu até cheguei acreditar que fosse, mas na verdade não é amor, é
identidade. Eu, sou otimista de carteirinha. Não importa quantas vezes as
pessoas me magoam, eu sempre vou acreditar. Por mais que eu caía, insisto em me
levantar e fazer de novo e de novo, quantas vezes preciso for. Talvez seja
excesso de determinação ou gosto por machucados, mas eu sempre fui repetente em
meus erros, sempre boba em minhas crenças. Ele, por sua vez, sempre teve o
orgulho maior que qualquer outra coisa. Quando cai, levanta rápido, mas quando
ninguém percebe ainda lamenta os machucados, mas nunca, nunca dá o braço a torcer.
Guarda tudo pra si... endurece e esfria por dentro.
Eu sou o que ele tem de melhor e ele o que eu tenho de pior. Nos completamos. Somos pessoas idênticas sentindo tudo errado.
Eu sou o que ele tem de melhor e ele o que eu tenho de pior. Nos completamos. Somos pessoas idênticas sentindo tudo errado.