sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Carta Extraviada (O que eu nunca deveria dizer)

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Eu sempre fui de me apaixonar fácil. Desenvolvi essa capacidade com o Leonardo DiCaprio, depois com o meu professor de biologia, o professor de literatura, o carinha da biblioteca... mas, todos - todos - platônicos. E sempre me dei muito bem com isso. Até porque naquela época a reciprocidade do beijo de língua não me parecia muito higiênica.
Até que um dia encontrei um garoto alto, de pele morena, cabelo liso partido para o lado, um sorriso bonito e um olhar de estrelinhas. Gostei dele de cara. Estudávamos juntos no cursinho e logo descobrimos afinidades maiores do que passar para a mesma escola técnica. Nós gostávamos das mesmas séries, os mesmos filmes, os mesmos desenhos animados, revistas em quadrinhos. Conversávamos na entrada da aula, no intervalo e não demorou muito para matarmos aulas.
Eu sentia algo diferente por ele... e não demorou muito para que ele começasse a sentir o mesmo por mim.
Eu, afobada como sempre, declarei logo que era amor e ele, entrou na dança. Nos gostávamos, nos dávamos bem e isso bastava. Andávamos de mãos dadas, ríamos, ficávamos pertinho um do outro, mas nada de beijos ou contato mais físico. O ano acabou. Nós não passamos. Ficamos em escolas diferentes e foi ai que o negócio começou a mudar.
Eu já andava toda tristinha e desacreditada no cupido quando ele apareceu na minha escola. Quase morri. Coração acelerado, pernas bambas, borboletas no estômago. Meu Deus, eu estava apaixonada. Foi nesse mesmo dia o nosso primeiro beijo. O meu primeiro beijo.
Gamei mesmo. Dessa vez era diferente das outras paixões. Dessa vez era verdadeiro e recíproco. Pelo menos era isso que eu achava. Ele foi meu primeiro amor e, consecutivamente, minha primeira e mais dolorosa (por ser a primeira) decepção.
Chorei. Chorei tanto que seria capaz de acabar com a seca no sertão! Me dediquei a uma fossa com direito a ouvir as mais tristes músicas de Sandy e Júnior e me acabar em algumas caixas de chocolate.
Me fechei para balanço. Durante esse período eu ficava com a saudade e ele com outro alguém.
Era estranho porque eu não tinha mais notícias dele, não o via com nenhuma frequência e não nos restou mais nenhum amigo incomum, mas de alguma forma ele permanecia comigo. Se eu tivesse ido a um psicanalista naquela época ele diria que se tratava de um trauma "pós-pé-na-bunda", talvez eu não conseguia aceitar a rejeição já que eu sempre fui bastante mimada e amada por todos à minha volta. Enfim, racionalmente existiam inúmeras teorias, mas não era isso. Eu sabia que era algo mais forte.
O tempo enfim passou. Eu conheci outros garotos, namorei alguns deles, larguei esse troço de amor e me concentrei nos estudos. Entrei na faculdade.
Dia 08 de junho de 2011. Entro atrasada pra aula e me deparo com a última pessoa que imaginava ver na vida: Ele. Todo sonso teve a cara de pau de vir falar comigo como se eu fosse uma amiga de infância. E foi assim que eu passei a me comportar: A partir daquele dia, éramos, de fato, amigos de infância. 
Ele havia mudado. Já não tinha as tais estrelinhas que me encantaram. Agia como todos os outros. Tinha se transformado em um devorador de corações. Teve seu coração devorado. Eu fui amiga, conselheira, terapeuta e quase fada madrinha. O tempo passou e eu passei a enxergá-lo como nunca enxerguei ninguém na vida. Eu o conhecia, por fora e por dentro.
Alguns chamam de bipolaridade, outros juram ser traços de características sociopatas, mas eu não. Não o julgo porque o conheço. Porque eu sei exatamente o que ele sente. Sei como é ser um E.T. Não, não tem nada a ver com outro planeta . Não precisa informar ninguém da NASA! Não é disso que eu falo. Falo do "não se encaixar". Do sorrir por fora e gritar por dentro. De achar tudo um saco e fazer cara de paisagem. É sentir algo que dói. Uma dor que passa quando se está acompanhado, mas sempre volta a doer quando se fica sozinho. Dói mais ainda no meio da multidão.
Nossa relação é estranha. Eu estou sempre falando as mesmas palavras a ele. Ele, por sua vez, permanece com sua teimosia. E a gente segue se desentendendo, se desencontrando, seja no silêncio ou na repetição dos clichês. Nunca se afastando realmente e também nunca juntos. Uma lengalenga que pode até parecer amor - e eu até cheguei acreditar que fosse, mas na verdade não é amor, é identidade. Eu, sou otimista de carteirinha. Não importa quantas vezes as pessoas me magoam, eu sempre vou acreditar. Por mais que eu caía, insisto em me levantar e fazer de novo e de novo, quantas vezes preciso for. Talvez seja excesso de determinação ou gosto por machucados, mas eu sempre fui repetente em meus erros, sempre boba em minhas crenças. Ele, por sua vez, sempre teve o orgulho maior que qualquer outra coisa. Quando cai, levanta rápido, mas quando ninguém percebe ainda lamenta os machucados, mas nunca, nunca dá o braço a torcer. Guarda tudo pra si... endurece e esfria por dentro.

Eu sou o que ele tem de melhor e ele o que eu tenho de pior. Nos completamos. Somos pessoas idênticas sentindo tudo errado.

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